A movimentação de quase 100 máquinas, 150 caminhões e 400 homens envolvidos na construção da Linha Verde não alterou o nível de barulho na antiga BR 116; manteve o volume de partículas no ar (poeira) abaixo do padrão máximo permitido por lei e auxiliou arqueólogos a localizar sítios e indícios deixados por antigas populações que passaram pela região até 6 mil anos atrás.
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As informações constam de relatórios elaborados por professores e pesquisadores da Universidade Federal do Paraná (UFPR), instituição contratada pela Prefeitura de Curitiba para monitorar a obra, avaliando poluição sonora, poluição do ar e patrimônio arqueológico. Os relatórios foram apresentados pelas equipes da UFPR para cerca de 50 técnicos e engenheiros da Prefeitura nas áreas de trânsito, obras, planejamento e meio ambiente.
O trabalho dos pesquisadores começou no final de 2006, antes do início da obra, e foi considerado pelos técnicos e engenheiros da Prefeitura como um marco no planejamento e execução de obras em Curitiba. "Este trabalho nos dá um novo roteiro de como levar nossas obras e abre caminho para que isso passe a ser feito sempre", afirmou o geólogo José Antonio Zen, da Secretaria Municipal de Obras Públicas, que acompanhou o trabalho desde o início. "São dados importantes, que nos ajudarão no planejamento e execução de uma série de outros trabalhos", disse.
O monitoramento foi essencial, afirmou o coordenador da Linha Verde, Wilson Justus, para a realização da obra dentro de padrões e exigências ambientais e criou em Curitiba uma nova cultura na execução de obras. Foi um trabalho, explicou, previsto no próprio contrato feito pela Prefeitura com o Banco Interamericano de Desenvolvimento, financiador do projeto. As instruções passadas pelas equipes da UFPR, como a aspersão de água nos locais geradores de poeira, disse Justus, foram seguidas à risca.
Ruídos - Coordenado pelo professor Paulo Henrique Trombeta Zannin, titular da UFPR da área de engenharia mecânica e de acústica ambiental, o acompanhamento e o monitoramento das emissões sonoras na obra foram feitos com equipamentos, analisadores acústicos e softwares de mapeamento de última geração. "Foi um trabalho feito com a tecnologia mais avançada existente em termos de medidores e analisadores, o mesmo equipamento usado, por exemplo, na Inglaterra e Estados Unidos", afirmou.
Medições sonoras foram feitas em diferentes pontos da antiga BR antes e depois do início da construção da Linha Verde. Com um tráfego de cerca de 2.000 veículos por hora, o nível sonoro era de 73,4 decibéis antes do início da obra. Em um dos momentos mais críticos em termos de emissão de ruídos, na avenida Santa Bernadethe - que foi totalmente refeita e pavimentada em concreto -, este nível ficou em 74,3 decibéis, o que tecnicamente é considerado sem alteração. Este valor fica bem abaixo dos 90 decibéis permitidos por lei em canteiros de obras.
"A conclusão é que as obras da Linha Verde não provocaram um impacto ambiental sonoro maior do que o gerado pelo tráfego de veículos na região", afirmou Zannin. Ele disse acreditar que quando pronta, a Linha Verde, com redução no tráfego de carga pesada e velocidade urbana monitorada terá um nível de ruídos inferior ao da antiga BR 116.
Ar - Também a poeira gerada pelas obras da Linha Verde foi mantida dentro das normas graças à aspersão de água, com caminhões pipa, nos canteiros de obras. O trabalho de acompanhamento, monitoramento e modelagem ambiental da qualidade do ar, coordenado pelo professor Nelson Luiz Dias mostrou que, sem obras, a concentração média de partículas no ar era de 38 µg/m³ micro gramas por metro cúbico). Com a obra, sem aspersão de água,este indicador praticamente dobra, passando a 74 µg/m³. Embora o padrão máximo previsto pela legislação seja de picos de até 240 µg/m³ ou uma média anual de 80 µg/mm³, na obra da Linha Verde foi adotada a prática de aspersão de água, contendo os níveis de poeira.
"Nós, pesquisadores, ficávamos muito felizes ao encontrar nas obras os caminhões pipa e perceber que as recomendações técnicas estavam sendo observadas", afirmou o professor André Malheiros, um dos pesquisadores da equipe responsável pelo monitoramento da qualidade do ar na obra da Linha Verde.
Ancestrais - Máquinas escavadoras usadas na construção da Linha Verde tiveram ainda um papel secundário, além da obra. "De uma certa forma elas nos ajudaram na localização de sítios e indícios", afirmou André Borges, ao apresentar o trabalho da equipe responsável pelo projeto de acompanhamento, monitoramento e resgate do patrimônio arqueológico na área da Linha Verde, coordenada pelo professor Igor Chmyz.
"Esta é uma obra gigantesca que auxilia o arqueólogo a localizar o patrimônio enterrado", disse André. "A máquina faz buracos e nós pesquisamos". Na região pesquisada, os arqueólogos localizaram sítios e indícios da passagem e do cotidiano da Tradição Umbu, povo pré-cerâmico que teria vivido na região de Curitiba entre 4 mil e 6 mil anos atrás. Os Umbu, explicou o pesquisador, não faziam cerâmica, usavam a pedra lascada, não polida, e habitavam margens dos rios, das nascentes à foz".
Depois deles, surge, na região, a Tradição Itararé, que também deixou vestígios resgatados pelos arqueólogos na Linha Verde. "Eles são os antecessores dos Caingangues, dos povos da língua Gê, como os Bororo e os Xavante. Seminômades, fazem cerâmica de pequenas proporções, possivelmente para carregá-las com mais facilidade e habitam na meia encosta e topo de morros. Estudos indicam que a Tradição Itararé viveu na região de Curitiba em torno do ano mil antes de Cristo.
Depois dela vieram os povos neobrasileiros, que também deixam indícios localizados pelos arqueólogos na Linha Verde. São povos oriundos da Europa que para sobreviver adotavam técnicas indígenas, mas com memória européia. Alças, bicos e fundos chatos começam a aparecer nos utensílios domésticos, antes lisos e de fundo arredondado.
A cerâmica, depois, passa a ser substituída pelas faianças e porcelanas com cores e desenhos, presentes em diversos fragmentos encontrados em pontos da Linha Verde, especialmente na região dos bairros Pinheirinho e, um pouco mais à frente, Umbará. Já é o tempo dos imigrantes, dos resquícios deixados por quem passou por aqui no início dos anos 1800 e 1900. É o caso, por exemplo, de uma parede em ruínas, coberta de vegetação, localizada no bairro Campo do Santana, numa região identificada pelos moradores como Cemitério dos Índios. Comparada às construções do início do século passado, a pequena parede parece ter pertencido a uma capela.
Os dados apresentados pelo arqueólogo encantaram os participantes da reunião que puderam manusear pontas de projéteis, fragmentos de cerâmica e velhas ferramentas de pedra. A arqueologia, disse André Borges, estabelece uma identidade e cria uma relação positiva do ser humano com o lugar que ele habita. "Sempre digo que para ensinar uma criança a cuidar do seu meio ambiente é preciso ensinar história", afirmou.
Linha Verde - A Linha Verde começou a ser construída em janeiro do ano passado, ao longo de 9,4 quilômetros entre os bairros Pinheirinho e Jardim Botânico. As obras estão sendo feitas sem o fechamento do trânsito no trecho onde antes existia a BR 116 e por onde passam por dia 45 mil veículos.
A Linha Verde é um conjunto de obras que prevê a implantação de 18 quilômetros de canaletas dos ônibus Expresso, uma avenida com quatro pistas em cada direção e, no trecho em obras, dez quilômetros de ciclovia, parque com 21 mil metros quadrados, oito estações de transporte e reforma de trechos de 30 ruas abrindo novos caminhos e pontos de ligação entre os lados leste e oeste da cidade.
A UFPR na Linha Verde
Acompanhamento e Monitoramento das Emissões Sonoras
- Coordenado e apresentado pelo professor Paulo Henrique Trombetta Zannin
Acompanhamento, Monitoramento e Modelagem Ambiental da Qualidade do Ar
- Apresentado pelos professores Nelson Luis Dias (coordenador) e André Malheiros
Acompanhamento, Monitoramento e Resgate Arqueológico
- Coordenado pelo professor Igor Chmyz, apresentado pelo arqueólogo André Borges