Pioneira no Brasil no acolhimento às mulheres vítimas de violências, a Pousada de Maria completa 25 anos de funcionamento agora em 2018. Bodas de prata de uma unidade de acolhimento institucional que atende mulheres em situação de risco social e vítimas de violência doméstica, acompanhadas ou não de seus filhos. A Pousada de Maria tem como principal marca o apoio e a oportunidade para o recomeço de vidas e sonhos.
Desde que foi criada, em 11 de novembro de 1993, a unidade acolheu 7 mil mulheres e seus filhos, que chegaram até o local por meio das equipes da assistência social de Curitiba ou encaminhadas pelos órgãos do Sistema de Garantia de Defesa e Garantia de Direitos.
A pousada foi criada pela primeira-dama Margarita Sansone, então presidente da Fundação de Ação Social (FAS), durante a primeira gestão de Rafael Greca como prefeito de Curitiba. “Eu fundei a Pousada de Maria há 25 anos e nós temos muito a comemorar. Isso porque nós, unidos - mulheres, juízes e uma série de pessoas que estão além desta casa -, conseguimos salvar muitas pessoas que sofriam violência”, disse Margarita.
Ela explica que a ideia de criar a unidade surgiu a partir do trabalho de abordagem à população em situação de rua na cidade. Naquela época, as equipes perceberam que havia muitas mulheres em situação de risco social, a maioria vítima de violência, abandonadas por suas famílias, sem moradia e desempregadas. Muitas eram também usuárias de entorpecentes ou apresentavam problemas relacionados à saúde mental.
Recomeço
Letícia (nome fictício) chegou à Pousada de Maria em setembro de 2017. Passou um mês no local, acompanhada do filho, depois de registrar boletim de ocorrência, na Casa da Mulher Brasileira. “Eu fugi e levei apenas algumas roupas. Tinha muito medo e demorei dois dias até tomar coragem de denunciar”, disse. Letícia foi casada por 26 anos com um homem que bebia todos os dias e quando chegava em casa, muitas vezes, a agredia verbal e fisicamente.
Segundo ela, a casa foi um “momento de acolhimento e carinho”. “Eu tinha minha família que me apoiava, mas não tinha segurança, nem para mim, nem para meu filho. Na casa me sentia segura. Foi onde me deram apoio e me mostraram que havia saída e o caminho que eu devia seguir para tudo dar certo. Se não tivesse a pousada, não teria conseguido sair, talvez tudo tivesse sido mais sofrido”, declarou. Hoje, Letícia trabalha e, com a ajuda da família, alugou uma casa onde mora com o filho.
Para Lurdes (nome fictício), a casa é o grande apoio que as mulheres vítimas de violência precisam. “A gente chega sem expectativa de nada, sem saber para onde ir, chegamos feridas. Mas aqui recebemos apoio, uma palavra amiga”, disse. “É como se fosse um casulo, onde a gente entra como uma larvinha e vai desabrochando e quando sai, se torna uma borboleta”. Lurdes está acolhida na pousada há mais de quatro meses e espera a decisão da Justiça para retomar a guarda dos três filhos.
Serviço
A Pousada de Maria é um equipamento da proteção social da FAS. Seu endereço é mantido sob sigilo para preservar a segurança das mulheres e crianças que para lá são encaminhadas. “A equipe técnica que trabalha no local busca primeiramente proteger as mulheres do risco, para depois, gradativamente, fazer sua inserção em diferentes serviços e oportunidades que favoreçam a autonomia e a superação”, explicou a diretora de Proteção Social Especial da FAS, Claudia Estorilio.
Quando chegam à unidade, as mulheres e crianças recebem roupas e calçados - já que muitos saem de casa sem conseguir levar seus pertences -, kits de higiene, fraldas para os bebês, entre outros itens necessários para o bem-estar. No local há quartos, refeitório, brinquedoteca, sala de atividades, sala de medicamentos, despensa para alimentos, alimentação elaborada e acompanhada por nutricionista, e até um espaço de beleza.
De acordo com a demanda individual e familiar, as mulheres e seus filhos são encaminhados e acompanhados para outros serviços da rede de atendimento, como áreas da saúde, educação, sistema de Justiça, como delegacias e Defensoria Pública. Além disso, são direcionados para a confecção de documentos, participação em cursos profissionalizantes e para o cadastramento e entrevistas de emprego.
O programa Pousada de Maria inspirou outros governos, como o da Bahia, e foi elogiado por Maria da Penha, ativista-símbolo do combate à violência contra mulher cujo nome batizou a lei que trata do tema no Brasil.