Há exatos 50 anos, em maio de 1975, a Avenida Cândido de Abreu, principal eixo do bairro Centro Cívico, passava por uma obra que até hoje faz parte da paisagem urbana e da segurança viária da região. Era a implantação do divisor de concreto entre as pistas da avenida – um canteiro central que se estendia do cruzamento com a Rua Ernani Santiago de Oliveira até a Rua Inácio Lustosa.
Imagens resgatadas pelo Departamento de Gestão do Arquivo Público mostram a intervenção, que recebia elogios da população, enquanto outras obras em andamento na cidade geravam queixas. O registro visual do Arquivo Público serve de lembrete sobre como as transformações urbanas exigem paciência — e como seus efeitos positivos atravessam décadas.
Refúgio seguro
O projeto do separador das pistas, elaborado em agosto de 1974 e arquivado na Biblioteca do Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano de Curitiba (Ippuc), tinha como objetivo reduzir o risco de colisões e atropelamentos na via larga, que até então não oferecia refúgio seguro para pedestres durante a travessia.
A maior parte do canteiro central ainda existe. No trecho entre o Palácio 29 de Março, sede da Prefeitura, e a Rua Barão de Antonina, ele cumpre até hoje a função de dividir fisicamente as pistas da Cândido de Abreu.
Além de servir como “ilha” para quem atravessava a avenida, o divisor físico também coibiria ultrapassagens perigosas, com veículos invadindo a pista de fluxo contrário para ganhar tempo – um problema frequente, segundo jornais da época.
As intervenções na Cândido de Abreu há 50 anos incluíram ainda a instalação de novos semáforos, recapeamento do asfalto e a modernização da iluminação pública. Um estudo do Ippuc apontava que as melhorias visavam integrar a avenida ao sistema de vias rápidas da estrutural Norte, uma vez que a avenida servia de conexão da região central com as ruas Comendador Fontana e Lysimaco Ferreira da Costa.
A recepção da população foi registrada nas páginas do jornal O Estado do Paraná, na edição de 18 de maio de 1975. “As modificações que estão sendo feitas na Avenida Cândido de Abreu caíram no agrado tanto dos motoristas quanto dos pedestres”, destacava a reportagem, que também trazia o depoimento de um morador: “Quem anda a pé finalmente terá vez”.
Reclamações e “intranquilidades”
Mas nem toda obra era bem recebida naquele maio de 1975. A mesma página do jornal estampava o título “Trânsito difícil”, com texto que relatava congestionamentos causados pelo fechamento do Viaduto do Capanema, interditado para avaliação e reparo de imperfeições na estrutura. Ruas como João Negrão, Engenheiros Rebouças e Visconde de Guarapuava ficaram sobrecarregadas, gerando críticas da população. Um taxista resumia a insatisfação: “O desvio de trânsito está louco, uma baderna. Ninguém entende mais nada”.
Outra obra que gerava “intranquilidades” entre os curitibanos, segundo o jornal, era a canalização do Rio Belém sob a Rua Tibagi, anunciada pela gestão do então prefeito Saul Raiz e prevista para durar 30 meses. Apesar das queixas, Raiz defendia a intervenção como estratégica para a integração viária da cidade: “Não se trata de um projeto simples, mas de uma obra para solucionar problemas e proporcionar a integração viária urbana para a distribuição do tráfego para a Zona Norte de Curitiba, que considero como a realização mais importante para os próximos quatro anos”.
Para Marcio Teixeira, coordenador-geral da Unidade Técnico Administrativa de Gerenciamento (Utag) da Prefeitura de Curitiba, unidade responsável por projetos estruturantes em parceria com organismos internacionais, o histórico ajuda a entender que obras e incômodos caminham juntos.
“Os transtornos durante as obras são inevitáveis e fazem parte da rotina urbana desde sempre. Mas o que permanece são os benefícios: tanto a Avenida Cândido de Abreu quanto a canalização do Rio Belém transformaram a mobilidade e a qualidade de vida em Curitiba, com reflexos que duram até hoje”, afirma.
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Marcio Teixeira, coordenador geral da Utag.
História
A história da Avenida Cândido de Abreu, no entanto, é bem mais antiga. De acordo com o livreto Trilhas da Cidade da Gente (Fundação Cultural de Curitiba, 2007), no início do século 20, a via era conhecida como Rua do Oceano Atlântico e, depois, Rua da Graciosa. O nome atual, empregado a partir de meados do século passado, homenageia Cândido Ferreira de Abreu, prefeito de Curitiba entre 1913 e 1916, gestão responsável pela construção das praças Carlos Gomes e Eufrásio Correia.
Já o livro Centro Cívico: Um Bairro e Três Poderes (UniverCidade, 1998), de Eduardo Fenianos, informava que, nos anos 1970, a região da Cândido de Abreu ainda era marcada por contrastes. Apesar do “imenso progresso”, os moradores conviviam com esgoto a céu aberto e o mau cheiro do Rio Belém não canalizado, cenário que só mudaria com as obras estruturantes daquele período.