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Educação

Espaço para crianças incentiva adultos a concluir os estudos

Acolhimento de crianças incentiva adultos a terminar os estudos. Curitiba, 06/05/2014 Foto: Valdecir Galor/SMCS

Quando o relógio marca 19 horas, Felipe dos Santos, de 9 anos, começa a apressar a avó materna, com quem vive, para que juntos sigam à Escola Municipal Rachel Mader, no Cajuru. Aos 65 anos, a auxiliar de limpeza Maria das Mercês Silva encontrou no neto o incentivo que faltava para voltar a estudar em uma das turmas a educação de jovens e adultos (EJA) ofertadas na escola.

Enquanto Maria recupera o tempo em que ficou afastada dos estudos, Felipe brinca e se diverte na Sala de Acolhimento da escola, um espaço especial onde filhos e netos dos estudantes das diferentes modalidades de escolarização para jovens e adultos adultos são atendidos por professores enquanto os adultos estudam.

As Salas de Acolhimento integram um conjunto de medidas adotadas pela Secretaria Municipal de Educação de Curitiba para incentivar jovens e adultos atendidos pela EJA a persistir nos estudos. É uma política que vem dando excelente resultado. A evasão nos anos iniciais da EJA vem caindo progressivamente: era de 34% em dezembro de 2012 e em abril deste ano estava em 17%.

Felipe é uma das 85 crianças atendidas em Curitiba nas oito turmas em Salas de Acolhimento, uma das medidas estratégicas incluídas no projeto dos Centros de Referência da Educação de Jovens e Adultos, o Cereja, desenvolvido pela Secretaria Municipal da Educação. O Cereja tem hoje 600 estudantes, nas mais diversas modalidades de ensino.

Possuem este espaço para os cuidados com os filhos dos adultos que precisam completar sua escolarização as escolas municipais Senador Enéas Faria, Augusta Ribas, Dona Pompilia e Helena Kolody, inseridas no projeto Cereja. Também contam com os espaços as escolas Rachel Mader e Professor Brandão.

As salas são espaços muito próximos às de aula dos adultos e que garantem que a família possa estar reunida na escola. Como na maioria dos casos as aulas da educação de jovens e adultos (EJA) acontecem à noite, para liberar os adultos para o trabalho de dia, as Salas de Acolhimento incentivam ao estudo, em especial as mães que não teriam com quem deixar os filhos para dedicarem-se ao estudo.

 A diversidade de brinquedos, o contato com crianças de diferentes idades, o afeto da professora, além da garantia de estar próximo dos pais têm conquistado as crianças que a exemplo do Felipe, tem se tornado importantes incentivadores para o aprendizado dos adultos responsáveis.

“Claro que eu quero muito que a vó aprenda mais, para arranjar outro tipo de trabalho, mas também gosto que ela vá à escola para que eu reencontre com meus amigos e a professora Cris, que é muito carinhosa”, confessa o garoto. No período da manhã, Felipe frequenta o 4º ano na Escola Municipal Marumbi.

A professora Cristiane Nasbone atende a Sala de Acolhimento frequentada por aproximadamente 20 crianças, entre elas Felipe. Durante as quatro horas que permanecem com ela, as crianças cantam, dançam, pintam e desenho e, sobretudo, brincam muito nos cantos que são montados e remontados a cada dia, com uma diversidade de brinquedos, jogos e fantasias.

“As atividades da Sala de Acolhimento não têm a finalidade pedagógica, mas embora estejam ali para brincar, ficarem próximas de seus pais, em conforto e segurança, o aprendizado acaba acontecendo a todo momento, pois os brinquedos são educativos e é por meio da brincadeira que muito conhecimento é transmitido até mesmo entre uma criança e outra”, explica a professora Cristiane Nasbone.

Tanto Felipe quanto Maria são estudantes especiais dentro da escola. Reconhecida na comunidade como mulher guerreira, participativa e zelosa na educação do neto, Maria decidiu retornar os estudos para tentar melhorar sua condição financeira. Participante assídua de oficinas do programa Comunidade Escola, que garante oficinas e atividades gratuitas nas escolas nos fins de semana, Maria descobriu o talento para preparar doces de comporta durante oficinas de culinária que fez gratuitamente pelo programa.

“Aprendi a preparar os doces, mas percebi que precisaria aprender a ler para conhecer novas receitas, inovar. Escrever também é fundamental porque penso em ter iniciar a produção de doces para vender”, conta Maria.

Na escola, Felipe conheceu Ritilier, de 7 anos, um dos seus melhores amigos. “Adoro vir à escola a noite, junto com a minha mãe que vem para saber mais e depois me ajudar nas lições”, conta Ritilier, que é aluno dedicado na Escola Municipal Michel Kurhy.

Ritillier é filho da dona de casa Sabrina dos Santos Adão, de 20 anos. Retomar os estudos não foi fácil para a jovem que abandou a escola na 5ª série do ensino fundamental, aos 12 anos de idade, para cuidar do filho que havia nascido. “Aguentei firme até o último dia da gravidez, mas depois foi impossível conciliar os estudos e os cuidados do bebê. Voltar para a escola só foi possível agora, com a oportunidade de poder tê-lo próximo”, diz Sabrina, que sonha em ser advogada.

Próximo da sala onde a mãe busca recuperar o tempo perdido entre textos, cálculos e teorias, Ritiler se diverte na companhia dos colegas. Parar a brincadeira só é permitido quando chega a hora de lanchar.

O recreio é um importante momento de integração das famílias, adultos e crianças recebem alimentação e são os pais quem alimentam os filhos.

Motivação

Contar com o espaço para a filha brincar em segurança e conforto também foi a motivação para o casal, Schawany dos Santos e David Ignaszewski, pais de Nathlalya, de 4 anos. “Vem a família toda para escola. É um momento de união e uma oportunidade que não podíamos deixar passar”, diz Schawany.

Ter o espaço onde a filha pode brincar em segurança foi decisivo para que Schawany pudesse volta a estudar. A interrupção da escolaridade aconteceu mais de uma vez, por razões muito comuns a grande maioria da população analfabeta de Curitiba. Em uma das tentativas de retorno, foi perseguida na rua por um marginal, enquanto voltava da escola. “Agora posso vir acompanhada do marido, sem correr perigo”, diz Schawany.

Formação 

Por se tratar de uma estratégia eficiente no combate ao analfabetismo, as Salas de Recurso estão ganhando investimentos, tanto na aquisição de matérias e brinquedos, quanto na formação dos profissionais que atuam no espaço. Em maio, a Secretaria Municipal da Educação promoveu uma formação continuada para as professoras acolhedoras. O objetivo do curso foi debater a importância do vínculo com os pais que precisam estar seguros e compreender a proposta do serviço. Também foi discutido no curso a ampliação de propostas recreativas, pedagógicas e lúdicas que podem e devem ser colocadas em prática com as crianças, durante o tempo de acolhimento.

Permanência

Outras medidas colocadas em prática pelo projeto Cereja têm ajudado a permanência dos jovens e adultos que retornam ou iniciam tardiamente o processo de escolarização. As unidades integradas ao projeto se tornam espaços qualificados de ensino e aprendizagem.

Além da Sala de Acolhimento, os estudantes das modalidades de EJA também contam com a possibilidade de participar de cursos profissionalizantes por meio do Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico (Pronatec). São 400 estudantes matriculados no Pronatec pela rede municipal, nos cursos de Massagista, Operador de Computador e Fotógrafo. Essa modalidade de ensino está presente nas escolas municipais Dona Pompília, Augusta, Enéas Faria, Raquel Mader e Brandão.

Atividades esportivas, postos descentralizados de serviços como documentação, vacinação, e fortalecimento do vínculo com as Unidades de Saúde, além de palestras são outras ações do projeto. “Temos como meta inicial a implantação de ao menos uma unidade do Cereja em cada regional da cidade”, disse a Secretária Municipal da Educação, Roberlayne Borges Roballo.

Iniciativa

Curitiba é a capital com o menor índice de analfabetos, são 2,1% da população. Ainda assim, 30 mil pessoas precisam ingressar ou retornar aos bancos escolares e, para isso, estratégias inovadoras como o Cereja estão sendo colocadas em prática pela administração municipal. Entre os diferenciais do projeto está a possibilidade de oferecer diferentes formas de alfabetizar, com propostas voltadas as especificidades de cada grupo.

Jovens interessados na ascensão no mercado de trabalho têm currículo que privilegia o desenvolvimento das competências, enquanto pessoas de mais idade – principalmente as mulheres acima dos 60 – contam com turmas que funcionam no período da manhã.

Projeto Cereja:

Atua em três regionais de Curitiba: Cajuru, Pinheirinho e Bairro Novo

São 600 estudantes nas diversas modalidades de ensino

Salas de Acolhimento

Escolas onde há o espaço: Senador Enéas Faria, Augusta Ribas, Dona Pompilia, Helena Kolody, Rachel Mader e Professor Brandão.

8 turmas

85 crianças (em média) frequentantes