Quem diz que Curitiba não tem tradição carnavalesca nunca esteve nos ensaios das escolas de samba. Há um mundo que gira em torno do reinado de momo e das evoluções das agremiações, que passam o ano se preparando para o desfile do sábado de carnaval (este ano, dia 14), na Avenida Marechal Deodoro, no centro da cidade.
São 60 minutos entre a concentração e o final do desfile. Um tempo curto, que acelera a adrenalina de centenas de pessoas, ávidas para mostrar tudo o que foi planejado, construído, bordado e sonhado nos 11 meses anteriores. “É a realização de um sonho”, diz Fernanda Ramos, da Realeza, a primeira Rainha de Bateria transexual da história do samba de Curitiba. Aos 27 anos, formada em design de moda e com pós graduação em Comércio Exterior e Linguística, Fernanda desfila elegância no Grêmio Recreativo Cultural Escola de Samba Acadêmicos da Realeza.
Elegância que pode ser conferida também na bateria, que imprime um ritmo forte sob o comando de mestre Márcio Brinco. “São 16 anos de Realeza e 33 no carnaval”, diz o comandante, que sabe como tirar o melhor de cada um dos 76 ritmistas. “O que me enche os olhos de satisfação é a nota 10”, afirma, com a experiência de quem sabe o que faz. Ele mantém entre os componentes na bateria três filhos, três irmãos e quatro sobrinhos para perpetuar o gosto pelo samba. “Carnaval é tudo. Faz parte da família”, diz o mestre.
Jú de Paula é a intérprete oficial do samba enredo da Realeza. Sabe que a emoção e o amor ajudam a levantar a plateia e promover a alegria e animação dos mais de 500 integrantes da escola, durante o desfile. “Estão todos atentos à minha voz. Por isso minha energia transpassa o samba enredo. É amor às cores da escola e ao pavilhão”, diz ela.
O tema da Realeza para 2015 é a “História de Curitiba pelas mãos de Fernando Guimarães”. Pai Fernando de Ogum, como era mais conhecido o advogado e cartorário curitibano, morto em 2012, fundou o Terreiro Pai Maneco, que pratica a Umbanda Pés no Chão, sem misticismos, somente com a obediência aos espíritos, o respeito à natureza e ao livre arbítrio. “Esta homenagem representa para nós, do terreiro, uma grande emoção, pois demonstra o trabalho de amor e caridade realizado por Pai Fernando”, diz a mãe de santo Denise Zanchetta, do Terreiro Pai Maneco.
Criatividade
Os integrantes de cada escola se empenham na preparação para o desfile e na superação das dificuldades que muitas vezes enfrentam para colocar o enredo na avenida. “Usamos a criatividade para melhorar o efeito dos materiais menos nobres nos figurinos” conta o carnavalesco Felipe Guerra, 32 anos, quatro de carnaval e arquiteto durante o resto do ano. “As fantasias da Realeza estão sendo montadas em papelão”, diz ele, afirmando que a beleza está em explorar tecidos e colocar toda a emoção em cada peça.
Fantasias são levadas por foliões e passistas, símbolo da alegria que envolve o Carnaval e potencializa o significado do samba. Antigamente conhecidas como cabrochas, as passistas são escolhidas pela comunidade ou em concursos abertos ao público. “Basta ter carisma, samba no pé, desenvoltura. Ou seja, a graça. Aqui a gente ensina como ter autoestima, postura corporal e usar a maquiagem” explica Sérgio Maker, diretor das passistas.
É desta ala que saem muitas meninas que mais tarde integrarão a corte como princesas e rainhas. Incontáveis são aquelas que viram cidadãs dosamba. Como Joice Kelly dos Santos, 29 anos, três filhos, técnica de enfermagem e Rainha da Escola. “Tive que trocar meu plantão no hospital para ir para a avenida no sábado de carnaval. Mas sempre tem quem ajude. Meus amigos que não estão no plantão já confirmaram que vão me aplaudir. Afinal, é meu primeiro ano de destaque. Estou feliz e ansiosa, fazendo tudo certinho para ver minha escola ser campeã”, diz.
A Realeza sai na avenida no sábado (14), à 1h30 da manhã.
Carnaval 2015
O texto sobre a Realeza é o primeiro de uma série que o portal da Prefeitura publica a partir de hoje sobre as escolas de samba do Grupo A do Carnaval de 2015: Leões da Mocidade, Mocidade Azul, Imperatriz da Mocidade e Embaixadores da Alegria.