Em uma hora e meia de troca de ideias, com participação online que ultrapassou 200 espectadores pelo YouTube, a aula inaugural da Cátedra Curitiba tratou de história, presente e das expectativas de futuro da capital paranaense.
O economista urbano e diretor de Planejamento do Ippuc, Alberto Paranhos, e o professor do Programa de Pós-Graduação em Gestão Urbana (PPGTU) da Escola de Belas Artes da PUCPR, Clóvis Ultramari expuseram opiniões e compartilharam experiências sob um prisma comum: a cidade depende de soluções urbanas locais para o atendimento de carências sociais e de inovação com vistas à sustentabilidade.
O professor Clovis Ultramari ressaltou que a parceria entre o poder público e a universidade, iniciada com a Cátedra Curitiba, resulta em uma equação de complementariedade na qual a gestão pública tem autonomia em respostas para o maior porcentual, porém em parte precisa da academia como aliada. Para ele, a gestão pública é 80% por ela mesma e em 20% precisa da academia. Já no cenário da universidade, a academia não pode estar alheia ao que acontece na cidade. Precisa de 50% da experiência externa.
“É aí que está o grande laboratório. Poder oficializar essa aproximação é interessante. Por isso a minha animação com esse vínculo que a gente formaliza hoje”, observou o professor Clóvis Ultramari.
Num resgate histórico, Paranhos destacou como novidades no processo de transformação urbana promovida por Curitiba, o Plano Diretor, que linearizou o crescimento da cidade sobre eixos de adensamento centrados no sistema de transporte e o fechamento da Rua XV de Novembro aos pedestres.
De acordo com Paranhos, na primeira lei de Zoneamento, em 1975, o Ippuc se inspirou no trabalho do um economista alemão Schumacher, que tinha como conceito: “the small is beautiful – o pequeno é bonito.
“Em vez de a gente tentar conseguir poucas coisas muito grandes, vamos tentar fazer na cidade muitas coisas em pequena escala. Essa foi outra novidade no caso de Curitiba. Tentar conciliar porte e natureza das atividades e usos de modo a ter coisas na escala vicinal, na escala de bairro, na escala setorial e outras”, explicou Alberto Paranhos.
O diretor do Ippuc ressaltou, entretanto, que soluções urbanas não devem ser copiadas pela parte, mas sim em todo o contexto, respeitando questões geomorfológicas, sociais e ambientais. “Quando pessoas vêm do mundo inteiro visitar o Ippuc a gente diz para que não tentem levar daqui projetos específicos. Que entendam a lógica do planejamento vamos tentar fazer com que essa lógica seja repetida”.
Desafios
No que diz respeito aos desafios e projetos urbanos, na opinião de Ultramari, o foco é trabalhar com soluções locais e consertar distorções que existam na cidade. Quanto a erros e omissões cometidos por Curitiba na história recente de planejamento, o professor disse que é difícil mensurar ou comparar, no presente, as ações do passado.
“Onde Curitiba errou? Evidente há coisas que deram certo e outras não. Você tem projetos muito bons, mas por algum motivo, seja de financiamento ou circunstancial, não pode ser implementado. Avaliar as coisas que foram feitas no passado com os olhos de hoje é difícil. Há práticas que no modelo atual de urbanismo e de legislação poderiam ser cerceadas, como o fechamento da Rua XV, por exemplo. O que me interessa é qual é a intenção do projeto.”, disse o professor.
Do ponto de vista do poder público, Alberto Paranhos destacou que não é possível fazer tudo, em todos os lugares ao mesmo tempo. Que é preciso ter opções, porque o tempo e o orçamento não permitem tudo.
Ele discordou que tenha havido algum tipo de erro ou omissão da municipalidade. “Que houve erro, por si só, não acredito. O que pode ter acontecido são projetos que não chegaram ao resultado pretendido”, observou.
Paranhos citou o setor estrutural como exemplo. “Achávamos que o setor imobiliário iria correr direto ao setor estrutural, porque tem mais potencial construtivo e tem toda a infraestrutura colocada. Só que não foram. Preferiram fazer outras coisas. Todo mundo quer fazer torres de até 40 andares no Batel, mas não querem fazer coisas mais modestas, por exemplo, no Cabral ou no Boa Vista. Então, por que isso? Será que é uma coisa cultural ou só do mercado imobiliário? Não sei. É uma questão a ser estudada”.
Para o diretor de Planejamento do Ippuc, um dos desafios que teremos de enfrentar com muito esforço é o de fazer a habitação de interesse social ficar dentro da área urbanizada da cidade. Segundo ele, hoje, infelizmente, o financiamento federal leva a ter casas, mas não cidade.
“Acredito que as cidades brasileiras não têm déficit de moradia, têm déficit de cidade. É um problema muito sério. A pessoa, mesmo que more em uma casa modesta, pequena, precisa abrir a porta e ter uma cidade em volta. Com serviço, água, esgoto, luz, telefone, saúde educação, transporte, etc... e não morar em uma casa melhorzinha, lá longe, e sair dela e não ter nada, nem o transporte”, frisou Paranhos.
O economista urbano e diretor do Ippuc ressalta que esse é um desafio grande, porque o custo do terreno está inviabilizando a maior parte desses investimentos. “O governo federal ainda não se deu conta de que é importantíssimo existir um subsídio ao terreno. É melhor subsidiar o custo do terreno para que esse programa habitacional esteja melhor dentro da cidade do que simplesmente pensar na casa - o que beneficiaria basicamente a indústria da construção que faz um monte de casa e depois a prefeitura que se vire com implantação de escolas, unidades de saúde e demais equipamentos urbanos”.
Paranhos destaca que a promoção da habitação de interesse social é prioridade no Ippuc, como parte do plano municipal. “Estamos lidando com isso nesse momento. Vamos tentar fazer um esforço muito grande para forçar a entrada no mercado de terrenos vazios, baldios ou ociosos dentro da cidade porque eu acredito mesmo que esse é um dever social e de justiça da cidade para com a população mais carente”, disse.
Curitiba no longo prazo
Sobre os aspectos que não podem faltar para planejar a Curitiba no longo prazo, Alberto Paranhos, apontou como determinante o cumprimento compromissos básicos de sustentabilidade urbana. Para ele, Curitiba não tem que ser a melhor em alguma coisa específica. “Curitiba tem que ser melhor do que ela mesma foi ontem. Não adianta dizer que a cidade melhor do mundo é tal. A obrigação da gestão pública é fazer cada dia o melhor para o futuro. E o futuro começa hoje”.
Entre algumas das ações em curso no Ippuc alinhadas a esse objetivo estão projetos de descarbonização do transporte público e de fortalecimento de novas centralidades nas regionais, promovendo a qualidade de vida no bairro, tendo o bairro como unidade de planejamento “É nessa ótica que temos que caminhar com o planejamento. Espero que os jovens colegas se preocupem muito em não ficar importando soluções, modismos ou coisas marqueteiras que surgem por aí. Que simplesmente enxerguem a necessidade do dia a dia das pessoas que estão contando com esse planejamento”, finalizou Alberto Paranhos.
Para assistir o evento de lançamento da Cátedra Curitiba pelo YouTube acesse o Canal PUCPR ou o canal da Escola de Belas Artes da PUCPR.